Inteligência Artificial: Por que fogem os políticos desta nova realidade?
Inteligência Artificial | «Dos políticos esperamos que sejam visionários, capazes de antecipar o futuro, que enfrentem os desafios de frente com coragem.»
O cientista norte-americano John McCarthy, que nos deixou em 2011, com 84 anos, acreditava que «a inteligência humana pode ser tão precisamente descrita que é possível construir uma máquina que a simule». Isto não se tratava, nem mais, nem menos, do que a Inteligência Artificial (IA).
Foi precisamente McCarthy que, em 1956, numa conferência no Darmouth College, falou pela primeira vez em IA. Depois disto foi a evolução que é conhecida por todos nós.
O investigador Yuval Noah Harari, no seu recente livro “Homo Deus”, fala de um mundo que evoluirá mais nos próximos 50 anos do que nos últimos150.000. E em grande medida essa evolução passará pela IA.
A Inteligência Artificial há uns anos que está omnipresente nas nossas vidas. Não é coisa de filmes de ficção científica. É uma realidade a ultrapassar a ficção.
Inteligência artificial | «O mundo deixará de ser como o conhecemos. O Homem vai ter de se debater com outro ser inteligente, fruto da sua criação»
Esta mudança extraordinária e empolgante tem ao mesmo tempo um lado obscuro e ameaçador. Por vários motivos. É simultaneamente facilitadora das nossas vidas, mas também violadora da nossa privacidade e uma ameaça que se colocará mais dia menos dia no nosso quotidiano.
Mas mais. O mundo deixará de ser como o conhecemos. Pela primeira vez, o Homem vai ter de se debater com outro ser inteligente, que é fruto da sua criação.
Alguns investigadores estimam que, nos próximos 20 a 40 anos, o Homem será substituído por máquinas em sete de cada dez tipos de profissões,como são as tarefas repetitivas de uma recepcionista, de um motorista, de um pedreiro, um operário fabril, de um operador de telemarketing, de um bancário, entre muitas outras.
«Estas mudanças não vão ficar por aqui. Vão atingir também o trabalho intelectual»
Mas estas mudanças não vão ficar por aqui. Vão atingir também o trabalho intelectual. Outros investigadores calculam que, nos próximos 20 anos, cerca de 20 % de muitas das tarefas de cariz intelectual também passarão a ser desempenhadas por máquinas.
Esta mudança está a fazer-se muito mais velozmente que aquilo que percepcionamos. As transformações estão a ser tão rápidas que caminhamos para um mundo tecnológico em que não conseguimos sequer acompanhar a velocidade estonteante a que ocorrem as mudanças, muito menos compreendê-las.
Ainda recentemente, tomámos conhecimento de que o algoritmo do Facebook poderá ter influenciado as eleições americanas em que Donald Trump foi eleito presidente dos Estados Unidos da América, derrotando de forma surpreendente Hillary Clinton,que contava com o apoio da esmagadora maioria dos jornais, rádios e televisões norte-americanos.
Muito recentemente, o maior fundo de investimento do mundo anunciou que 75% das decisões passarão a ser efectuadas por IA, inclusive as contratações e os despedimentos.
Mais, por exemplo, o conhecido portal de alojamento local Airbnb, que não possui um único quarto, disponibiliza hoje mais quartos do que os maiores grupos hoteleiros mundiais, prestando este serviço com recurso a apenas 3000 funcionários, quando a cadeia Hilton possui 152.000 trabalhadores.
«Os veículos autónomos não demorarão muito a ser uma realidade. Isto fará com que passemos a fazer uma utilização muito diferente do nosso carro»
Os veículos autónomos não demorarão muito a ser uma realidade. Isto fará com que passemos a fazer uma utilização muito diferente do nosso carro. Não tardará muito a que o automóvel que utilizamos apenas duas ou três horas por dia tenha uma utilização útil que poderá chegar, em tese, às 24 horas/dia.
Estas alterações acelerarão as desigualdades que até hoje conhecemos. As novas tecnologias tornarão os ricos mais ricos, enquanto os rendimentos das pessoas comuns terão tendência para estagnar ou até mesmo baixar, sendo que, pela primeira vez,acontecerá que as próximas gerações ganharão menos que os seus progenitores.
O indivíduo enquanto entidade individual perderá o seu valor, porque será controlado por algoritmos. Apesar disso, o mundo vai continuar a precisar de professores, de informáticos, de gestores ou de médicos, mas com a noção de que o sistema conhecerá melhor estas pessoas do que os próprios. E a consequência desta mudança será inevitável passando a maioria das decisões a serem tomadas pelos sistemas de IA.
«Continuaremos a viver num mundo em que existirão pessoas insubstituíveis, a que Yuval Noah Harari chama ‘super-humanos’»
Porém, continuaremos a viver num mundo em que existirão pessoas insubstituíveis, a que Yuval Noah Harari chama “super-humanos”, que serão sempre os orientadores de uma IA, que não será uma inteligência verdadeiramente autónoma.
Mas esta será uma elite cada vez mais reduzida, em que será notória uma diferença profunda entre a casta superior dos “super-humanos” e a esmagadora maioria das pessoas, que passarão a ser dominadas por estes últimos e pelos algoritmos informáticos.
Nos próximos anos, esperam-nos mudanças gigantescas no trabalho, nas empresas e na economia. Estas mudanças devem ser motivo de uma enorme preocupação, nomeadamente daqueles que nos governam, mas que teimam em fazer de conta que nada está a acontecer.
A Inteligência Artificial não faz parte do léxico da classe política. É um debate a que os políticos fogem “como o diabo foge da cruz”. É claro que os políticos não pretendem trazer para o espaço mediático esta discussão, que, apesar de fascinante,trará enormes consequências directas na vida das pessoas como até agora a conhecemos.
«Dos políticos esperamos que sejam visionários, capazes de antecipar o futuro, que enfrentem os desafios de frente com coragem»
E com esta discussão será inevitável falar-se de desemprego, de um novo conceito de trabalho, de perda de rendimentos, no fundo, de uma nova economia a que que já ouvi apelidar de “Economia 4.0”, sendo que nem os pseudo-especialistas na matéria conseguiram explicar do que se trata na realidade.
Dos políticos esperamos que sejam visionários, capazes de antecipar o futuro, que enfrentem os desafios de frente com coragem, porque é o destino das próximas gerações que está em jogo. Dos políticos esperamos que ajam e não reajam.
Este será muito provavelmente o debate mais importante das próximas décadas. Vamos a ele, sem medo, com coragem.
Paulo Vieira da Silva
Gestor de Empresas / Licenciado em Ciências Sociais – área de Sociologia
(Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico)
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