Como funciona o cérebro de um terrorista
Como funciona o cérebro de um terrorista? Fabiano de Abreu Rodrigues, neurocientista com vastos conhecimentos em história, antropologia, biologia, psicanálise, neuropsicologia e neurociência, traça o mapa da mente dos extremistas.
O Afeganistão está de novo, 20 anos depois, nas mãos dos Talibã. O país tinha sido tomado por aliados internacionais com a finalidade de eliminar o centro a partir de onde o terrorismo, estabelecido, preparava e lançava ataques contra os “infiéis”. O motivo – uma espécie de guerra santa – serve, no entanto, apenas para legitimar os verdadeiros intentos extremistas. Por que o fazem e, principalmente, como o fazem é a questão a que o neurocientista Fabiano de Abreu Rodrigues responde. Afinal, como funciona o cérebro de um terrorista?
A lógica do terrorista: os fins justificam os meios
“A lógica deles guia-se nos fins para justificar os meios”, atesta o neurocientista. Ou seja, “a religião é a desculpa para explorar o lado mais sádico dentro de cada terrorista”. “O nosso organismo é adaptativo. Logo, quando corpo e cérebro se adaptam a experiências stressantes, isso torna-se um ciclo vicioso, e de necessidade.”
Formado em “história, antropologia, biologia, psicanálise, neuropsicologia e neurociência” e “conhecendo a história deste grupo Talibã, considerado o mais violento de todos”, Fabiano de Abreu Rodrigues traça um resumo do mapa da mente dos extremistas. “Quando falamos em ética e moral, questões básicas para o desenvolvimento do caráter social – nos terroristas, julgamentos morais dependem do resultado das suas ações. A maioria da sociedade mundial pensa ser inadmissível atos terroristas, por via de regra algo óbvio e racional. Mas quando a racionalidade está formatada sobre uma crença enraizada desde o nascimento, como fazer entender pela via da razão?”
A motivação religiosa nos atos extremistas
“Historicamente, até religião católica cometeu atrocidades, no período das Cruzadas, tal qual os terroristas”, lembra o estudioso. “Com a evolução da inteligência – e, com isso, da lógica –, o panorama mudou”, explica. “A mudança e a despedida fazem parte da evolução. Instalamos a partir daí novos paradigmas. Isto, contudo, não acontece com os grupos fundamentalistas-terroristas porque a sua cultura cristalizou no tempo.”
Como antes referido, “a lógica deles guia-se nos fins para justificar os meios” a religião “é a desculpa para explorarem o lado mais sádico dentro de si”. “O nosso organismo é adaptativo, logo, quando o corpo e o cérebro se adaptam a experiências stressantes forma-se um ciclo vicioso e de necessidade.
Os dois tipos de terroristas
“Há dois tipos de terroristas”, enumera Fabiano de Abreu Rodrigues. Existem “os que se fazer explodir e obedecem ou aqueles que lideram e mandam explodir”. “Podemos separá-los pela inteligência. Por isso, não interessa ao Talibã que as mulheres estudem, tornando-se assim mais difíceis de manipular. O mesmo acontece com os que obedecem. A sua limitação cognitiva não permite articular o pensamento abarcando novos modelos mentais. Isto tem relação entre duas regiões do cérebro: o córtex pré-frontal e o sistema límbico. Na psicologia, podemos encontrar explicações mediante a personalidade, como uma dízima periódica de possibilidades. Todas elas, contudo, encontram-se nessas duas regiões” cerebrais.
“Antes de mais nada, precisamos de ter a consciência de que somos organismos vivos, animais em que o que nos diferencia dos demais é o desenvolvimento do lobo frontal do cérebro, que nos concedeu raciocínio lógico e conduziu a um comportamento social e a tomadas de decisões conscientes das suas consequências de forma lúcida.” Portanto, “os nossos comportamentos têm como determinante, à priori, o instinto que envolve o sistema límbico”. Ou seja, “as nossas respostas são sempre de precaução para sobreviver, assim como reproduzir para manter a espécie”. Qualquer pensamento contrário a isso é “incoerente sobre a biologia e a nossa personalidade”, garante.
Categorizar os terroristas
Os que comandam e não se explodem “beneficiam do poder, são recompensados pela liderança, pelo comando, conseguindo o que querem e recompensando quotidianamente, aguçando o narcisismo, que vai aumentando a cada vez que são recompensados”. “Isto acontece pois a dopamina é viciante e gradativa. Quando mais libertamos, mais ansiosos para libertar mais e sempre queremos mais.”
“Da mesma forma, um toxicodependente sofre com a abstinência, pois a droga é o mecanismo externo para maior libertação deste neurotransmissor. A ausência de drogas provoca no organismo uma falta praticamente indomável. Toda a personalidade do líder advém desta potência narcisica e todas as disfunções que ela causa. Como são mais inteligentes, conseguem melhores formas de manipular os outros, usando a religião como o seu melhor meio de convencimento, sem interrupções”, considera.
Os que obedecem e se explodem
“Geralmente, são jovens, onde a região cerebral da inteligência não está totalmente desenvolvida, já que esta finaliza o desenvolvimento aos 24 anos de idade. O sistema límbico, da emoção, determina as atitudes mesmo que incoerente para muitos. Também a falta do conhecimento e da experiência para o raciocínio cognitivo sobre seus atos é essencial”, diz o neurocientista.
“Trata-se de pessoas em grande maioria pobres, que se sentem excluídas, ou inferiores, muitas sem conhecimento ou geneticamente com QI menos desenvolvido devido às centenas de gerações sem condições de plasticidade cerebral que desenvolva o lobo frontal de forma a que se torne mais resiliente.” Os obedientes “têm no ato em si a própria recompensa”, porque “acreditam que o seu nome será fixado num legado de um grande ato”. “Acreditam que serão lembrados, que fizeram algo recompensador, algo memorável e heróico que lhes terá garantido um lugar melhor “no paraíso”, suprindo assim a falha que o levou a cometer atos terroristas.”
Instinto de sobrevivência
Para sobreviver, precisamos de ter “a noção real do perigo e encontrar formas de reagir”. Por isso, “a ansiedade surge sempre que estamos em situações de perigo, receio e medo”, provocando “memórias negativas que, semanticamente, nos remetem para uma atmosfera de preocupação e planeamento para posterior execução”. “É fácil de entender – a ansiedade é como uma pendência, existe para que possamos trazer a solução ou ela não se contenta”, esclarece.
O neurocientista enumera situações que o exemplificam. “Mudança sde rotina, receio económico, medo de adoecer, enfim, tudo o que coloque o nosso bem-estar e a própria vida em risco. “Para isso, a ansiedade leva-nos às memórias formatadas no nosso cérebro, através da amígdala cerebral, que nos mostre o perigo e, assim, possamos salvar-nos. Por exemplo, “quando o medo é económico, o cérebro vai trazer à tona memórias de prejuízos económicos de que já nem nos lembrávamos”. “É como se tivéssemos gavetas estereotipadas com cada tipo do problema”, simplifica.
Sobrevivência e recompensa
Também na categoria sobrevivência “entra a recompensa”. “Neurotransmissores como a dopamina são produzidos quando conquistamos algo. É igualmente essencial para a nossa sobrevivência. Um bom exemplo é que quando estamos com fome, a sensação de comer liberta dopamina, que faz com que a ansiedade nos faça buscar a comida para que tenha recompensa. Somos guiados pela recompensa da mesma forma que os animais que recebem comida ao serem domesticados. Isto permite-nos criar mapas mentais para conquistarmos o nosso objetivo, através de experiências arquivadas. Faz parte do instinto”, conclui.
Reprodução para sobreviver
“Negar que existimos para sobreviver e que a reprodução faz parte para manter a espécie é negar que se tenha qualquer apetite sexual. Ou a vontade não existiria por quase toda a vida, com exceções de disfunções que alterem a normalidade do organismo”, começa por explicar Fabiano de Abreu Rodrigues. “Por isso, vemos sexo em todo o lado, inclusive nas redes sociais ou nas bailarinas daquele cantor engraçado no palco. Nesta categoria, entra o narcisismo, que, como tudo na vida, quando fora do equilíbrio, torna-se um problema.
“Um dos maiores problemas da sociedade digital é o narcisismo – chegando a casos patológicos – e este é a necessidade de ser visto, lembrado, notado, para libertar aquele neurotransmissor da recompensa. Isto acontece porque precisamos de nos destacar para chamar a atenção do parceiro e, semântico a isso, como tudo na vida, entra a semântica e o equilíbrio, chamar a atenção do grupo ou de toda uma sociedade”, analisa.
As regiões do cérebro
“Sistema límbico – Região relacionada com a emoção. Ela se forma primeiro que o lobo frontal, também conhecida como cérebro reptiliano, por ser mais antiga, também funciona de forma semelhante nos demais animais mamíferos. Ela é acionada no instinto, disfunções nessa região acarretam em perturbações, transtornos, síndromes, entre outros problemas mentais.”
“Lobo frontal – Mais especificamente o córtex pré-frontal localizado nesta região, é responsável pela tomada de decisões, pela lógica, pelo comportamento social, raciocínio e orquestra todas as inteligências. Quando há um problema no sistema límbico, a conexão entre estas regiões encontram-se prejudicadas podendo a pessoa ter atitudes impensadas, incoerentes, impulsivas sem pensar nas consequências. Essa região, quando pouco desenvolvida, também prejudica esta conexão de maneira mais eficiente. É a região da inteligência.”
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