Hospital Garcia de Orta fabrica conjunto de essências ajudar a recuperar o olfato após covid-19
O feito antecede a pandemia de covid-19, mas o atual momento motiva uma maior procura pelo conjunto de essências produzido pelos Serviços Farmacêuticos do Hospital Garcia de Orta para ajudar os doentes a recuperar o cheiro.
O feito antecede a pandemia de covid-19, mas o atual momento motiva uma maior procura pelo conjunto de essências produzido pelos Serviços Farmacêuticos do Hospital Garcia de Orta para ajudar os doentes a recuperar o cheiro. O Smell Test português foi buscar inspiração a uma experiência feita em Barcelona, ainda nem se sonhava que as nossas vidas seriam afetadas por um novo coronavírus que faz pontaria ao olfato.
Mas o teste original “estava adaptado à realidade catalã”, incluindo “cheiros mais estranhos, como por exemplo cogumelos”, e, por isso, a equipa do Garcia de Orta adaptou-o “à realidade portuguesa”, escolhendo “essências mais características”, que validou junto da população portuguesa, explicou à Lusa Armando Alcobia, diretor dos Serviços Farmacêuticos do hospital.
Anis, gasolina, aguarrás, fumado, tangerina, cogumelo, queijo, melão — são as essências que desaparecem do teste português, que opta por introduzir alfazema, canela, pinheiro, chocolate, laranja e café, “substâncias tipicamente portuguesas que estimulam os mesmos grupos de nervos”, explica Luís Antunes, diretor do Serviço de Otorrinolaringologia do hospital.
“O olfato acaba por ser uma questão de treino”, assinala o médico.
Quem tenha lido “O Perfume”, de Patrick Süskind, reconhece o poder do cheiro. Na Farmácia do Garcia de Orta, Mafalda Brito e Liliana Sobral estão a postos para produzir a essência do limão.
De repente, parece que estamos numa cozinha. Afinal, há uma balança e um tacho em banho-maria e mexer é o verbo do dia. Só que a substância manipulada tem o nome pouco gastronómico de polietilenoglicol (“peg”, para os amigos).
Pousada sobre a mesa está uma pasta prateada com 24 frasquinhos: as 23 essências que permitem diagnosticar problemas olfativos e um “branco” (espécie de limpa-palato, para usar entre cheiros).
Essa “bateria de avaliação olfativa”, com 23 essências, é utilizada com acompanhamento médico, mas para o kit de reabilitação, com apenas quatro essências, “o doente é autónomo”, pode levá-lo para casa para “fazer um cheiro sistemático de recuperação”, explica o diretor dos Serviço Farmacêuticos.
O Smell Test — diagnóstico e terapêutica — foi desenvolvido antes da covid-19, como resposta às necessidades do Serviço de Otorrinolaringologia do hospital, em parceria com a Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa.
“Com a covid, efetivamente, o olfato é um dos órgãos dos sentidos afetados e, muitas vezes, é o primeiro a fazer (…) a suspeita da positividade em relação à covid”, destaca Luís Antunes.
Os “cerca de 60” doentes em tratamento no Garcia Orta ainda não permitem obter “dados concretos quanto à sua recuperação”, mas “os resultados estão a ser favoráveis”, assinala, frisando que estimular a memória olfativa não garante uma recuperação a cem por cento.
“Bem mais importante” do que o diagnóstico — sublinha o médico — é a reabilitação e o tratamento. Por isso, o hospital tem desenvolvido “kits de reabilitação olfativa”, em que o doente tem os mesmos odores, mas com concentrações diferentes, para diariamente treinar o olfato.
Na vez de boiões estão agora unidoses, uma mudança provocada pela pandemia. As essências têm um tempo de vida de seis meses, mesmo que não sejam cheiradas — se o forem, duram três a quatro meses após abertas.
A pandemia “veio aumentar exponencialmente a necessidade de um teste, nomeadamente o de reabilitação”, reconhece. “Há mais procura, inclusivamente de outras unidades hospitalares”, refere Alcobia. O kit, quer de diagnóstico quer de terapêutica, já foi cedido a “vários hospitais, do Norte sobretudo”, pormenoriza Luís Antunes.
O Smell Test — assinala Alcobia — tem também “muito potencial em doenças neurológicas”, inclusivamente na antecipação do diagnóstico.
Se, na memória auditiva, há sons que nos ficam na cabeça e nos recordam do que fizemos e de onde estivemos, no olfato “é exatamente a mesma coisa”, compara Luís Antunes.
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