Necessárias novas receitas para jornalismo “porque economia mudou” – Trappel

O professor da Universidade de Salzburgo Josef Trappel defende, em entrevista à Lusa, que a democracia precisa de jornalismo de investigação e é preciso encontrar novas fontes de receitas para o apoiar “porque a economia mudou”.

Necessárias novas receitas para jornalismo

Josef Trappel, que foi orador principal da conferência da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), que decorreu na terça-feira, em Lisboa, é professor de política e economia dos media no Departamento de Estudos de Comunicação da Universidade de Salzburgo, Áustria.

Atualmente, o setor dos media enfrenta vários desafios, desde as grandes plataformas (redes sociais), como também encontrar novas formas de obter receitas porque o negócio da publicidade mudou.

Anteriormente, as pessoas pagavam assinaturas de jornais e esse era o modelo de negócio, começa por dizer o investigador austríaco. Os jornais recebiam dinheiro das pessoas e a atenção das pessoas era vendida à indústria da publicidade e a indústria da publicidade investia nos meios de comunicação através da realização de anúncios publicitários, enquadra Josef Trappel, quando questionado sobre o estado de arte dos media.

“Isso era algo muito estável”, sublinha, mas hoje os media são substituídos “por plataformas” que “não recebem nenhum dinheiro dos utilizadores porque as contas no TikTok, no Instagram”, entre outros, “são gratuitas”, aponta.

“O único dinheiro que recebem vem da indústria da publicidade. E a indústria da publicidade tem uma proposta de negócio muito melhor do que a dos meios de comunicação [social] tinham antes, porque eles podem ter publicidade direcionada, explica.

Os media estavam orientados para a audiência e registavam muitas perdas nos gastos de publicidade. “Agora essa perda é minimizada porque pode atingir pessoas com 25 anos, jovens mães com necessidades especiais que são alvo de publicidade nas plataformas, isso é algo que os media nunca poderiam ter feito”, diz o diretor do Departamento de Estudos de Comunicação da Universidade de Salzburgo e do programa de Mestrado conjunto Erasmus Mundus Comunicação Digital e Liderança.

Agora, “não há uma solução mágica para isso, mas precisamos de compreender o processo e depois podemos pensar em políticas para ajustar este processo às necessidades de uma democracia”, considera.

Portanto, “uma necessidade da democracia é que tenhamos jornalismo independente. Isso não é feito pelas plataformas de maneira nenhuma, nenhuma dessas plataformas emprega um único jornalista”, sublinha Josef Trappel.

As plataformas pegam no conteúdo jornalístico dos ‘sites’ jornalísticos e redistribuem aos utilizadores, aponta o professor, alertando para que se se ‘secar’ a fonte do jornalismo, “não haverá jornalismo nas plataformas de todo no futuro” e esse “é o perigo”.

Numa democracia, “precisamos de jornalismo de investigação independente. Por outras palavras, precisamos de apoiar a fonte desse tipo de jornalismo e esse apoio já não vem inteiramente da economia porque a economia mudou”, prossegue.

O investigador insiste na necessidade de “novas fontes de receitas e rendimentos para o jornalismo de investigação”, e isso pode passar, entre muitas outras coisas, por “subsídios públicos provenientes do Estado para apoiar o jornalismo que é tão importante para toda a população”.

Para que os meios de comunicação independentes possam sobreviver “significa que tenham meios financeiros suficientes para pagar as suas contas, ou seja, os salários dos jornalistas, os custos operacionais e assim por diante” e “esse dinheiro pode vir do Estado, desde que seja alocado de forma independente”, refere.

Além disso, “pode haver uma lei, por exemplo, a dizer que” se se fizer coisas específicas, “como jornalismo de investigação”, serão fornecidos fundos incondicionais dirigidos a esse resultado.

“É isso que se faz nos países nórdicos da Europa, isto é como é feito na Áustria, também é feito em Itália para que haja uma dissociação entre os fundos públicos e a independência do jornalismo e isso é essencial”, exemplifica.

Relativamente aos serviços públicos de media (SPM), destaca que estes têm um papel específico a desempenhar porque não seguem inteiramente a lógica do mercado”, mas a lógica de “missão” expressa num contrato.

Portanto, “se o público em geral concessiona ao serviço público de media a realização de coisas específicas, por exemplo, minorias, programas infantis, programas noticiosos de alta qualidade e assim por diante”, então “são obrigados a cumprir este tipo de solução, enquanto os media privados comerciais seguem para onde vai o interesse das pessoas”, retrata.

Josef Trappel refere que um SPM encarregado de fornecer notícias de qualidade permite que as pessoas tenham a informação necessária para deliberar democraticamente numa sociedade.

Assim, “na minha opinião, os meios de comunicação social de serviço público são indispensáveis nesta competição entre o serviço público e os meios de comunicação comerciais privados, porque mantêm o limiar de qualidade”, remata.

*** Alexandra Luís, da agência Lusa ***

ALU // CSJ

By Impala News / Lusa

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