O relato do jornalista sequestrado: “Cortaram-me a língua, mas pelo menos não cortaram toda”
O jornalista e bloguista guineense António Aly Silva, alvo de sequestro e espancamento na terça-feira, em Bissau, disse hoje à Lusa que a sua língua foi cortada, mas que vai continuar a fazer o seu trabalho.
O jornalista e bloguista guineense António Aly Silva, alvo de sequestro e espancamento na terça-feira, em Bissau, disse hoje à Lusa que a sua língua foi cortada, mas que vai continuar a fazer o seu trabalho.
“A cabeça está toda ferida, o maxilar, não consigo comer, só bebo leite, cortaram-me a língua, pelo menos não cortaram toda, mas há uma parte que se levanta e está a doer-me. Bebo água e dói”, afirmou Aly Silva, em declarações à Lusa.
Questionado sobre o que pensa fazer, o jornalista afirmou que não tenciona tomar nenhuma diligência que não seja continuar a fazer o seu trabalho, que disse ser “para o povo e para mais ninguém”.
Aly Silva, que tem carteira profissional de jornalista de Portugal, disse que tem sido agredido por elementos do poder na Guiné-Bissau, pelo facto de apoiar abertamente Domingos Simões Pereira, candidato que disputou a segunda volta das eleições presidenciais de 2019.
“O próprio Presidente (da República) diz que eu apoio o Domingos, eu apoio e continuo a apoiar, eu sou livre de apoiar quem eu quiser, não sou sequer militante do PAIGC, sou um cidadão com direitos e apoio quem eu quiser”, sublinhou.
O jornalista disse não esperar “nada da comunidade internacional”, a quem acusa de ter “pactuado com o golpe de Estado” na Guiné-Bissau e agora “está mais preocupada com o que se passa no Senegal”.
“Eu não estou aqui para a comunidade internacional me defender, eu consigo me defender quando puder, quando não posso acontecem estas coisas”, disse.
Autor do popular blogue “Ditadura de Consenso”, Aly Silva disse também estranhar o silêncio do Sindicato dos Jornalistas em Portugal.
“Sou jornalista com carteira profissional portuguesa e não ouvi nada. Pelo contrário, o que me surpreendeu foi ter lido uma declaração do sindicato dos jornalistas de Cabo Verde, foram firmes, mas do resto, de Portugal não ouvi nada”, declarou Aly Silva.
Contactada pela Lusa, a presidente do Sindicato dos Jornalistas de Portugal, Sofia Branco, disse que contactou o sindicato guineense para apurar o que se passou, mas ainda não obteve respostas.
A responsável referiu, no entanto, que “este tipo de violência é sempre condenável e representa uma ameaça à liberdade de imprensa e à independência do jornalismo na Guiné-Bissau”.
O jornalista realçou que antes de ser bloguista já possuía a carteira profissional, desde 1985.
“Até hoje mantenho a minha carteira renovável de dois em dois anos. Mas também não me preocupa isso, as pessoas sabem o que é que aconteceu”, declarou Aly Silva, que apresenta hematomas no corpo.
O caso foi denunciado na segunda-feira pela Liga Guineense dos Direitos Humanos e, contactada pela Lusa, fonte do Ministério da Defesa referiu que soube do incidente através daquela organização.
Várias organizações da sociedade civil têm denunciado diversas violações dos direitos humanos contra ativistas, políticos, deputados e jornalistas e órgãos de comunicação social.
Um dos casos mais recentes foi o de dois ativistas políticos do Movimento para a Alternância Democrática (Madem G-15), segunda força política do país e que integra a coligação no Governo, que denunciaram publicamente terem sido espancados alegadamente por guardas da Presidência guineense, dentro do Palácio Presidencial, um caso a que o Ministério Público guineense ainda não deu seguimento, de acordo com a Liga dos Direitos Humanos.
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