Anulada sentença que reconhecia contrato de trabalho entre estafeta e Uber Eats

O Juízo do Trabalho de Lisboa decidiu anular a sentença que reconhecia um contrato de trabalho entre um estafeta e uma plataforma digital devido à falta de citação da empresa, neste caso a Uber.

Anulada sentença que reconhecia contrato de trabalho entre estafeta e Uber Eats

A decisão do tribunal, avançada hoje pelo jornal Eco e a que a Lusa teve também acesso, refere que a citação pessoal por carta registada de uma empresa inscrita no Registo Nacional das Pessoas Coletivas “deve ser endereçada para a sua sede, conforme daquele registe conste”.

No entanto, de acordo com o tribunal, a mesma “não ocorreu”, pelo que “julga-se verificada a nulidade decorrente por falta de citação, anulando-se também os atos que dela dependeram, designadamente a decisão proferida”.

No final de janeiro, o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa reconheceu a existência de um contrato de trabalho, sem termo, entre um estafeta da Uber Eats Portugal e a empresa, com retroativos a maio de 2023.

“[…] Reconhece-se a existência de um contrato de trabalho, sem termos, entre Md Zaber Ahmed e a ré Uber Eats Portugal”, indicava a referida sentença.

O contrato em causa teria retroativos a 01 de maio de 2023, quando entraram em vigor as alterações ao Código do Trabalho.

Essa foi a primeira vez que um tribunal português aplicou a presunção de laboralidade entre estafetas e plataformas digitais.

A Uber contestou a decisão na altura, alegando não ter sido notificada, porque o Tribunal enviou a notificação, por troca de morada, para a Glovo.

De acordo com o documento que a Lusa teve acesso, a “ré requereu a anulação de todo o processo e requereu que a sentença lhe fosse notificada”, vindo ainda a interpor “recurso da sentença proferida nos autos, pelo que a notificação da decisão se tornou inútil”.

“A nulidade de todo o processo tem lugar nos casos de ineptidão da petição inicial, vício que aqui não está em causa. A invalidade verificou-se no ato de citação da ré, pelo que apenas cumpre anular o que depois dela se processe e que dela dependa, como a sentença, já anulada”, pode ler-se na decisão.

Para todos os efeitos, o processo volta ao início, podendo agora a Uber apresentar argumentos contra a presunção de um contrato de trabalho.

Entretanto, são já três os tribunais portugueses que decidiram a favor da independência e flexibilidade dos estafetas, nomeadamente, de Vila Real, Águeda e Bragança.

Fonte oficial da Uber avançou, numa resposta escrita à Lusa, que os estafetas “já deixaram claro que querem manter a sua independência e a liberdade para usarem as plataformas digitais quando, como e onde quiserem”.

“Do nosso lado, continuaremos a defender que a flexibilidade que os estafetas procuram deve ser preservada e que é compatível com direitos e proteções a que todos os trabalhadores, independentemente do seu estatuto, devem ter acesso”, disse a mesma fonte.

Na fundamentação da decisão da sentença que reconhecia o contrato de trabalho estava, entre outros pontos, o facto de ser a plataforma a fixar, de forma unilateral, o valor dos montantes a pagar ao estafeta pelas entregas, não havendo qualquer negociação prévia quanto aos critérios utilizados para a definição dos valores.

Por outro lado, a Uber Eats Portugal “controla e supervisiona” a atividade, “restringe a autonomia do prestador da atividade quanto à organização do trabalho” e também “exerce poderes de exclusão de futuras atividades na plataforma, através da desativação da conta”.

O tribunal concluiu também que o estafeta estava inserido na organização da Uber Eats Portugal, que “não é uma mera intermediária na contratação de serviços entre estabelecimentos comerciais e estafetas”.

Em novembro do ano passado, a então ministra do Trabalho e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, afirmou, no parlamento, que estavam então em curso 1.000 ações de reconhecimento de contratos de trabalho de trabalhadores de plataformas digitais em situação laboral irregular.

RCP (PE) // MAD

By Impala News / Lusa

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