Covid-19: Uso obrigatório da ‘StayAway Covid’ ataca liberdades fundamentais, diz Amnistia
A Amnistia Internacional Portugal defendeu hoje que tornar obrigatória a aplicação ‘StayAway Covid’ “coloca em causa liberdades fundamentais e direitos individuais”, questionando ainda o rumo e “modelos de governação” que estão a ser seguidos.
“A Amnistia Internacional Portugal considera que a proposta de lei para tornar obrigatória a utilização da aplicação StayAway COVID coloca em causa liberdades fundamentais e direitos individuais, afetando as pessoas de forma desproporcional e não tendo uma finalidade objetiva. A organização questiona ainda o rumo que está a ser tomado e os modelos de governação que se procuram legitimar com medidas desta natureza”, defendeu a AI em comunicado hoje divulgado.
A proposta do Governo para tornar obrigatórios a instalação e uso da aplicação StayAway Covid, que permite aos utilizadores receber notificações de contactos próximos com pessoas infetadas, já seguiu para o parlamento, mas está a gerar polémica, com alguns partidos e organizações a manifestarem-se contra uma medida que consideram autoritária e uma violação dos direitos e liberdades civis, tendo o Presidente da República já adiantado a intenção de pedir a verificação da sua constitucionalidade.
Também a AI entende que a aplicação, que “já gerava graves preocupações” quando o seu uso era facultativo, levanta agora, com a possibilidade de uso obrigatório, “mais questões, relacionadas com a liberdade e privacidade dos utilizadores, a aplicação da medida, a discriminação de várias pessoas e a verdadeira fiabilidade da aplicação”.
A AI questiona, relativamente à forma de aplicação da medida, como será feita a fiscalização pelas forças de segurança, perguntando se a verificação será aleatória e como se vai avaliar quais os telemóveis com capacidade, ou não, para ter a aplicação instalada.
O uso obrigatório retira aos cidadãos a possibilidade de escolha relativamente ao uso que dão aos seus próprios telemóveis, defendeu a AI, que identifica também perigos para a segurança.
“Do ponto de vista da discriminação, esta proposta levanta demasiadas questões. Em primeiro lugar, a medida parte do princípio de que todas as pessoas têm um telemóvel ou ‘smartphone’ com determinadas características, bem como um plano de dados ou acesso a wi-fi”, refere o comunicado que, citando o responsável de comunicação da organização de defesa dos direitos humanos, Paulo Fontes, questiona também se não ter saldo no telemóvel será punível, assim como estar numa zona com piores condições de rede móvel, situações que podem configurar uma discriminação de quem vive em situação de maior vulnerabilidade financeira.
A AI aponta ainda questões de literacia tecnológica de pessoas que possam ter equipamentos compatíveis com a aplicação, mas falta de conhecimento para a usar.
“Relativamente à fiabilidade da aplicação, dados da Pordata indicam que a utilização da aplicação por pessoas com atividade laboral ativa — incluindo funcionários das forças armadas e de segurança, e da Administração Pública — e estudantes faria com que a aplicação fosse instalada por cerca de sete milhões de habitantes. Contudo, nem todos têm ‘smartphones’ compatíveis e colocam-se ainda aqui as limitações relacionadas com a obrigatoriedade de ter a aplicação ativa fora do contexto laboral ou escolar”, acrescenta-se no comunicado.
No documento, Paulo Fontes manifesta dúvidas de que este seja o mecanismo e a resposta necessários e defende que “as respostas que dermos a esta crise têm de ser proporcionais à sua necessidade, ser efetivas e eficazes, focadas nas pessoas e nas comunidades, e estarem completamente centradas e alicerçadas nos direitos humanos”, acrescentando que não pode haver “qualquer exceção”.
Portugal contabiliza pelo menos 2.149 mortos associados à covid-19 em 95.902 casos confirmados de infeção, segundo o último boletim da Direção-Geral da Saúde (DGS).
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