Envolver oposição foi importante para políticas de longo prazo entre 1995 e 2019
Um estudo da Fundação Calouste Gulbenkian concluiu que a disponibilidade dos governos para envolver os partidos da oposição foi um dos fatores importantes para a aprovação de políticas de longo prazo entre 1995 e 2019 porque “diminuiu as hipóteses de contestação”.
“Dos vários fatores que identificámos como sendo importantes para a implementação, ou não implementação, de políticas de longo prazo, destacamos, em primeiro lugar, a disposição governamental para envolver oposição, stakeholders relevantes e lograr compromissos. Este foi um fator importante para a aprovação de medidas de longo prazo, já que diminuiu as hipóteses de contestação às mesmas”, lê-se nas conclusões do estudo. O estudo “Governar para a próxima eleição ou para a próxima geração? O caso de Portugal (1995-2019)”, hoje divulgado, é da autoria de Catherine Moury e Daniel Cardoso com Ana Paula Costa, Mafalda Escada (investigadores da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa) e foi publicado pela Fundação Gulbenkian.
Os autores analisaram “10 tentativas concretas (bem-sucedidas e fracassadas) de implementação de políticas que visavam a resolução de problemas sociais a longo prazo, impondo custos no presente em nome das gerações futuras” e, apesar “do contexto desfavorável à implementação deste tipo de políticas, foram identificados casos de sucesso bastante inovadores e que tornaram o país uma referência internacional”. No estudo, foram analisadas medidas em cinco áreas, como a Taxa de Recursos Hídricos, a descriminalização do consumo e da posse para consumo de drogas, a implementação da Contribuição Extraordinária de Solidariedade e a não implementação da Contribuição de Sustentabilidade ou o contrato único de trabalho.
Nas conclusões do estudo (com 76 páginas e que pode ser consultado no ‘site’ da Fundação Gulbenkian), os autores exemplificam que “a descriminalização do consumo e da posse para consumo de drogas” é um exemplo da importância do envolvimento de várias entidades, apontando que “o tema foi discutido no âmbito de comissões parlamentares, contou com o apoio da esquerda radical, do Presidente da República e envolveu cientistas e o movimento associativo, bem como figuras políticas relevantes à direita”. Com esta análise, os autores concluíram que também “a produção e comunicação científica mostraram-se importantes para elaborar a lei e justificar a adoção” de certa medida, “legitimando-a”, e que, igualmente, “a influência externa pode funcionar como uma janela de oportunidade para adoção de medidas de longo prazo”.
O estudo concluiu ainda que as “políticas a longo prazo são mais facilmente adotadas quando os governos são pressionados para resolver um problema”, e que “o papel da opinião pública, da sociedade civil organizada (ONG, parceiros sociais, movimentos sociais) e dos media é fundamental”. Pelo contrário, o mandato eleitoral, que é “uma das condições apresentadas pela literatura como sendo importante para a adoção de medidas de longo prazo, não se revelou um dos fatores mais relevantes nas políticas” analisadas, indicam os autores. Os autores recomendam então aos governos que envolvam “as partes interessadas”, estando dispostos “a fazer concessões” se necessário e utilizar “os constrangimentos europeus para contornar interesses setoriais instalados” mas “procurar consensos com as partes interessadas e com a oposição” face ao risco de reversões após uma crise.
E aconselham também os futuros governantes a “apostar na produção de conhecimento sobre a medida e comunicar efetivamente quais os ganhos da mesma e os custos de não a implementar, quer durante a campanha eleitoral, quer durante o mandato de governo” e ainda a “introduzir na Constituição formas de atender aos direitos/necessidades das gerações futuras, por exemplo através de limites à utilização de recursos naturais ou proteção da biodiversidade”.
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