Leis de cibersegurança chinesas representam risco para “qualquer pessoa e Estado”

A especialista norte-americana Jill Goldenziel alertou em entrevista à Lusa para as leis “particularmente preocupantes” de cibersegurança da China, que constituem um “risco de segurança” para qualquer pessoa e Estado que mantenha relações comerciais com o país.

Leis de cibersegurança chinesas representam risco para

À Lusa, Jill Goldenziel, internacionalmente reconhecida pelo seu trabalho sobre segurança internacional e guerra de informação, apontou que as leis “particularmente preocupantes” de cibersegurança chinesas implicam o armazenamento de dados dos indivíduos que negoceiam com a China dentro do próprio país, “o que constitui um risco de segurança para qualquer pessoa que faça negócios com a China e potencialmente um risco de segurança nacional para os Estados desses indivíduos”.

A China tem vindo a desenvolver “A Grande Muralha Jurídica”, que corresponde à promulgação de cerca de 21 leis relativas à segurança de dados e à cibersegurança do país, entre outros temas, segundo mencionou a académica que esteve em Portugal para uma palestra na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa sobre “Lawfare and Cyberspace”.

A professora salientou que, para enfrentar a muralha chinesa, é necessário “pressionar a China para que esclareça o que estas leis significam para as empresas ocidentais” e investir numa educação “muito mais ampla das empresas e dos indivíduos sobre o que significa para si quando fazem negócios com a China”.

Jill Goldenziel é professora na Faculdade de Informação e Ciberespaço em Washington, é colaboradora com o Departamento de Defesa dos Estados Unidos e é consultora e palestrante sobre as áreas de Direito, Segurança e Geopolítica, entre outras.

Foi-lhe atribuído o Prémio Serge Lazareff 2022 do Gabinete de Assuntos Jurídicos do Comando Aliado de Operações da NATO no Quartel-General Supremo das Potências Aliadas na Europa pelo seu trabalho e investigação na área de operações jurídicas.

Sobre o desenvolvimento da tecnologia de Inteligência Artificial, a especialista doutorada em Governo pela Universidade de Harvard alertou igualmente que a guerra de informação tornou-se “muito mais complexa”, devido à “velocidade a que a informação poderá ser criada e divulgada”.

“Estamos a viver numa época na qual existem vários modelos de Inteligência Artificial concorrentes, incluindo os que refletem os valores das pessoas ou dos Estados que os criaram, e os utilizadores têm de ser capazes de compreender que estão a receber respostas infletidas por um sistema de valores, tal como fariam se estivessem a receber respostas de um orador cujo sistema de valores fosse mais evidente”, afirmou à Lusa Jill Goldenziel, também colaboradora da revista Forbes em matéria de segurança nacional.

Para fazer face ao problema da desinformação, Goldenziel frisou a importância da educação da população, uma ferramenta essencial para que os indivíduos possam melhorar a sua capacidade de “detetar discursos falsos, ter o pensamento crítico necessário para identificar a desinformação e verificar as suas fontes”.

No entanto, frisou, tal “requer muito tempo e pode levar gerações” até ser alcançado.

“O que é importante, entretanto, é que os Estados, as empresas e qualquer pessoa interessada em que a verdade seja divulgada, encontre indicadores de confiança ou desenvolvam a confiança e a fiabilidade necessárias para poderem ser consideradas fontes de confiança, numa época de tanta informação”, salientou.

Sobre os perigos de uma potencial ameaça cibernética em grande escala, e se tal cenário poderia ser motivo para um eventual acionamento do artigo 5.º da NATO, Jill Goldenziel sublinhou que os Estados que compõem a aliança militar ocidental “ainda não chegaram a acordo” sobre se um ataque cibernético, com efeitos puramente cibernéticos e não letais, constituiria um ataque armado.

Ainda assim, a investigadora no Gabinete de Assuntos Jurídicos do Quartel-General Supremo das Forças Aliadas na Europa da NATO, afirmou que o Artigo 5.º da Aliança Atlântica poderia ser de facto acionado através de um ciberataque, caso a sua dimensão e efeitos fossem “semelhantes a um ataque armado”.

“Se houvesse um ataque cibernético que desencadeasse uma explosão nuclear, por exemplo, tal poderia ser considerado um ataque armado. Mas será que só o facto de ter havido um ciberataque o torna um ataque armado? Não. Em última análise, seria a utilização da arma nuclear que constituiria o ataque armado”, referiu Goldenziel.

O Artigo 5.º é a pedra basilar do tratado fundador da NATO e expressa que os países signatários concordam que um ataque armado contra um ou vários desses países será considerado um ataque a todos.

A especialista norte-americana também destacou as capacidades da NATO na área de ‘lawfare’, que, através do seu Quartel-general Supremo das potências aliadas na Europa em Mons, na Bélgica, e do seu Gabinete de Assuntos Jurídicos dedicado ao ‘lawfare’, constitui “um local excelente para os Estados poderem conversar e desenvolver entendimentos comuns sobre a lei”.

Goldenziel define ‘lawfare’ como “a utilização intencional do direito para atingir um determinado objetivo estratégico, operacional ou tático contra um determinado adversário”.

“É a utilização intencional da lei para reforçar a legitimidade dos próprios objetivos estratégicos operacionais ou táticos ou para enfraquecer a legitimidade dos objetivos estratégicos operacionais ou táticos de um adversário”, reforçou.

“O direito é a língua que os Estados concordaram em falar. Por isso, por ser a nossa língua franca, a linguagem do direito tem muito significado. É a linguagem com que os nossos aliados concordaram e é a linguagem com que os nossos adversários também concordaram”, prosseguiu.

As opiniões apresentadas por Jill Goldenziel nesta entrevista são as suas e “não representam necessariamente as da sua universidade, do Departamento de Defesa norte-americano, do Governo dos Estados Unidos, da NATO ou de qualquer outra entidade”, tal como a mesma frisou.

JYFR/RJP // SCA

By Impala News / Lusa

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