Paulo Rangel deplora divulgação de vídeo “após um jantar com amigos”
Opinião. Paulo Rangel reagiu à divulgação do vídeo em que surge a cambalear “após um jantar de amigos”. Deplora, diz, que lhe tenham “violado os limites da vida privada”.
Depois de um vídeo em que surge a cambalear nas ruas de Bruxelas ter sido tornado público, Paulo Rangel insurge-se pelo que considera ser a violação do direito dele à vida privada. Tem o eurodeputado razão em condenar este tipo de escrutínio? É discutível. Há o direito à privacidade e há o interesse público. A Lei – dependendo da interpretação jurídica – pode dar-lhe razão: o homem é um homem antes de ser eurodeputado, mas simultaneamente este homem não é apenas um homem apanhado aos esses depois de beber mais do que a conta. Este homem é um político com poderes de decisão em nome do Estado.
A reação do eurodeputado nas redes sociais
“Um vídeo depois de um excesso num jantar com amigos, há anos em Bruxelas, tornou-se viral. Não sei quem filmou, guardou e só agora divulgou. Deploro que o tenha feito, violando os limites da vida privada. Vida, em que como canta o Sérgio, todos temos glórias, terrores e aventuras”, reage Rangel nas redes sociais.
Paulo Rangel tem todo o direito a apanhar uma piela. Quem nunca…? Ao que não tem direito é a insurgir-se contra a divulgação do vídeo, alegando violação da vida privada. Entendamo-nos: é nas relações privadas e até íntimas que tantas vezes os decisores políticos se deixam enredar em teias subterrâneas. E perscrutá-los nesses momentos não só é legítimo como é um dever jornalístico – a mais certeira ferramenta do escrutínio –, mas também cívico.
O facto de um decisor político mandatado pelo Estado ter apanhado uma piela é notícia
Um dos mais entendidos estudiosos na matéria do Direito da Comunicação Social, Jónatas Machado, alega que “o direito à reputação não pode proteger pseudo-reputações”. “Não pode servir para impedir o escrutínio sobre questões de interesse público.” A consideração assenta em Paulo Rangel como fato à medida – não por ter sido filmado bêbedo, mas por ter-se insurgido publicamente contra a notícia de ter sido apanhado bêbedo. Mais: o facto de um decisor político mandatado pelo Estado ter apanhado uma piela é notícia e jamais deve ser repudiada.
O direito à privacidade perde valor “quando, por exemplo, qualquer tipo de práticas pessoais ou até íntimas” possa, “de alguma forma, condicionar depois o desempenho público”, diagnostica Jónatas Machado. “Assim como há uma íntima relação entre os vários poderes que muitas vezes estabelecem entre si relações de promiscuidade e, às vezes, apostando na opacidade, também há a interpenetração entre o dinheiro, o sexo e o poder. E em muitas ocasiões procura construir-se esferas de segredo em torno do dinheiro, por exemplo com o sigilo bancário, a falta de transparência dos paraísos fiscais… Procura também apostar-se no direito à privacidade para cobrir certos aspectos da vida íntima (…) que pode tornar-se muito importante para a esfera pública e para a saúde de uma democracia.”
Paulo Rangel deve ser escrutinado porque isto não é uma taberna, é uma Democracia
Paulo Rangel pode apanhar uma piela? Pode. Pode aparecer a criticar a divulgação de um facto que considera pessoal? Pode. Mas não pode livrar-se do julgamento sobre esses dois actos. Nem poderá escusar-se ao escrutínio se for questionado sobre quem eram os amigos, em que meios eles se movimentam e que interesses representam, do que falaram e porquê. Porque se algum dia o direito à privacidade se sobrepuser ao interesse público, não estaremos em Democracia. Estaremos numa taberna onde, entre um copo-de-três e outro, o pior que pode acontecer é perder-se ao dominó ou à lerpa e ir-se aos esses para casa.
OPINIÃO: Luís Martins | diretor
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