PM italiana Meloni posiciona-se como interlocutora privilegiada de Trump na UE
A primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, está a surgir a nível europeu como interlocutora privilegiada do Presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, tirando partido de afinidades ideológicas, mas também das convulsões políticas em França e na Alemanha.
No sábado, Meloni teve um encontro bilateral informal com Trump em Paris, à margem da reabertura da Catedral Notre-Dame, tendo sido publicadas várias fotos de ambos nas redes sociais, na companhia do magnata Elon Musk — um dos principais conselheiros do futuro Presidente norte-americano e admirador assumido da primeira-ministra italiana -, no que muitos entendem como mais um esforço da líder do partido pós-fascista Irmãos de Itália para se ‘credenciar’ na Europa como interlocutora privilegiada de Donald Trump no regresso deste à Casa Branca.
Essa aspiração é assumida pelo próprio partido de Meloni — que lidera uma coligação de extrema-direita e direita atualmente no poder em Itália -, com o deputado dos ‘Fratelli d’Italia’ Andrea Di Giuseppe, um empresário próximo de Trump, a comentar publicamente que “é evidente que Meloni vai desempenhar um papel de ponte entre os EUA e a UE”.
Também o próprio Donald Trump alimentou essa expectativa, ao afirmar em declarações ao New York Post desde Paris que se dá “muito bem” com a primeira-ministra italiana e que Meloni tem “muita energia” e é “verdadeiramente de fibra”.
No mesmo sentido, aquele que é classificado como o ‘braço italiano’ de Elon Musk, Andrea Stroppa, o primeiro a divulgar nas redes sociais fotos dos encontros de Meloni com Trump e com o dono da Tesla e SpaceX, comentou na rede social X (também pertença de Musk) que “a Itália tem a rara oportunidade de ter uma relação especial com os EUA” e ser “um interlocutor europeu privilegiado” de Washington, observando que “a relação de estima [de Meloni] com Elon, que muitos em Itália gostariam de boicotar” está também a proporcionar este novo cenário.
Estes desenvolvimentos parecem dar razão aos muitos atores políticos e analistas que concordam que Meloni está muito bem colocada para fazer a ligação entre Washington e Bruxelas, até porque a outra figura política europeia mais próxima de Trump, o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, está bastante isolado no bloco comunitário, ao contrário do que sucede com a dirigente italiana, que logrou manter-se na corrente dominante da UE, embora inicialmente tenha votado contra a nomeação dos novos líderes institucionais do bloco comunitário.
Na passada semana, o jornal britânico The Economist, apontando igualmente que Meloni “está entre os que pretendem ser o eixo da relação transatlântica”, considerou que há basicamente dois grupos de líderes europeus a “disputar o afeto de Trump”.
Um é formado pela ‘velha guarda’ do eixo franco-alemão, mas tanto o Presidente Emmanuel Macron como o chanceler Olaf Scholz estão muito fragilizados internamente, e pelas instituições europeias, pelas quais Donald Trump tem mostrado desdém; o outro é composto pelos seus “amigos ideológicos”, sendo que Orbán e o primeiro-ministro eslovaco, Robert Fico, não têm o apoio da UE.
Em declarações à Lusa, o investigador Filippo Simonelli, do Instituto de Assuntos Internacionais, comenta que Meloni, ainda com três anos de mandato pela frente, “é certamente a mais estável entre os responsáveis dos países de média dimensão da UE, o que lhe confere claramente uma vantagem não negligenciável”.
“Existem, evidentemente, pontos de contacto importantes entre o movimento MAGA [Make América Great Again, de Trump] e a base dos ‘Fratelli d’Italia’, desde a contenção da imigração até ao desejo declarado de combater a hegemonia cultural – e nas fileiras administrativas do Estado – imposta pelos seus antecessores”, diz.
O investigador nota ainda que representantes do partido de Meloni “são presença constante e de alto nível” nas conferências anuais dos Republicanos na Florida, “facilitando a troca de opiniões e informações entre os respetivos grupos dirigentes”.
Segundo este analista, “é certo que Meloni tentará atuar como intermediária entre os dois mundos”, o que lhe permitiria “beneficiar de um capital político sem precedentes”, mas tal “dependerá também do resultado das eleições [antecipadas] na Alemanha”, no início de 2025, “e, a mais curto prazo, do eventual rearranjo interno da cena política francesa”.
Simonelli adverte também que “o alinhamento ideológico com Trump é talvez menos claro do que parece”, pois, “em questões como o comércio internacional, a Itália não pode deixar de ter interesses contraditórios em relação ao protecionismo declarado pela nova administração da Casa Branca” e, relativamente à NATO, “se Trump retomar a sua cruzada histórica” contra o ‘parasitismo’, real ou presumido, no seio da Aliança, não é certo que a Itália tivesse os recursos para cumprir as suas obrigações em tempo útil”.
Numa entrevista na passada sexta-feira à cadeia NBC News, Trump ameaçou retirar os Estados Unidos da NATO se os aliados europeus não “pagarem as suas contas”, sendo que a Itália é um dos países muito aquém de consagrar 2% do PIB a despesas de defesa, como reclama Washington: em 2024 a despesa deve quedar-se pelos 1,49% e recuar para 1,44% nos próximos dois anos.
Filippo Simonelli diz que, tanto quanto se pode observar, “Meloni pode contar com uma certa ascendência em relação a Elon Musk” -, mas ressalvou que “também aqui há uma série de incógnitas”, designadamente o papel concreto que este desempenhará além de liderar o “fictício DOGE” (Departamento de Eficiência Governamental) e, “sobretudo, se a convergência com Trump será duradoura”.
Para já, Giorgia Meloni está na linha da frente dos líderes políticos europeus a gozar de credibilidade e simpatia junto da futura administração norte-americana — e também no seio da União Europeia — e, de acordo com o diário italiano La Repubblica, no encontro de Paris recebeu já um convite de Trump para assistir em Washington à sua tomada de posse, a 20 de janeiro próximo, que a primeira-ministra italiana “aceitou de bom grado”.
ACC // APN
By Impala News / Lusa
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