Síria vai precisar de 55 anos para regressar aos níveis económicos pré-guerra

Ao ritmo atual de crescimento, a Síria, país onde 14 anos de guerra apagaram décadas de desenvolvimento, não regressará ao seu nível económico pré-conflito antes de 2080, quase 55 anos a partir de agora, estimou hoje a ONU.

Síria vai precisar de 55 anos para regressar aos níveis económicos pré-guerra

“Além da ajuda humanitária imediata, a recuperação da Síria exige investimentos de longo prazo em desenvolvimento, para construir estabilidade económica e social para seu povo”, disse o chefe do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Achim Steiner, citado num comunicado.

Steiner enfatizou em particular a importância de “restaurar a produtividade para empregos e reduzir a pobreza, revitalizar a agricultura para segurança alimentar e reconstruir a infraestrutura para serviços essenciais como saúde, educação e energia”.

Como parte de uma série de avaliações após a queda do regime de Bashar al-Assad em dezembro passado, o PNUD apresentou hoje três cenários para o futuro socioeconómico do país.

“As simulações de crescimento económico indicam que se a Síria continuar a crescer à taxa modesta observada nos últimos anos — cerca de 1,3% ao ano entre 2018 e 2024 — o seu Produto Interno Bruto (PIB) não regressará aos níveis pré-guerra antes 2080, daqui a quase 55 anos”, aponta a projeção da ONU.

“Esta projeção impressionante sublinha os imensos desafios económicos futuros e a necessidade urgente de políticas que acelerem o crescimento, atraiam investimento e reconstruam infraestruturas e indústrias essenciais para encurtar o calendário de recuperação”, frisa o documento.

A urgência é ainda maior porque hoje, após 14 anos de guerra, nove em cada 10 sírios vivem na pobreza, um em cada quatro está desempregado e o PIB é menos da metade do seu valor de 2011, de acordo com o relatório.

Já em relação ao índice de desenvolvimento humano, que leva em consideração a expectativa de vida, a educação e o padrão de vida, caiu para um nível abaixo do de 1990 (a primeira medição no país), em mais de trinta anos de desenvolvimento apagados pela guerra.

Nesse contexto, o PNUD analisou o ritmo de crescimento necessário para regressar ao PIB pré-guerra ou, ainda mais ambiciosamente, para atingir o nível de PIB que o país poderia ter esperado se a guerra não tivesse ocorrido.

No cenário mais “realista” de regressar apenas ao PIB de 2010, seria necessário um crescimento anual de 7,6% por 10 anos, ou seja, seis vezes a taxa atual, ou 5% por 15 anos, ou 3,7% por 20 anos, segundo essas projeções.

Mas para atingir o PIB que a Síria poderia ter se a guerra nunca tivesse acontecido, o crescimento teria que atingir 21,6% ao ano por 10 anos, 13,9% por 15 anos ou 10,3% por duas décadas.

Apenas uma “estratégia abrangente”, incluindo uma reforma de governança e reconstrução de infraestruturas, permitirá à Síria “retomar o controlo do seu futuro” e “reduzir a sua dependência de ajuda externa”, comentou Abdallah Al Dardari, diretor do PNUD para os países árabes.

Numa videoconferência com a imprensa, Al Dardari frisou hoje que o povo da Síria não pode esperar 55 anos para recuperar o seu desenvolvimento e, num tom de otimismo, pediu uma “visão clara das autoridades nacionais” e reformas drásticas de governação, com “instituições capazes, transparentes, responsáveis, representativas e inclusivas”.

Al Dardari defendeu também a necessidade de mais investimentos no país, reconstrução das infraestruturas, estabilização macroeconómica, proteção social, revitalização do setor produtivo e que se “reconsiderem seriamente as sanções” que vigoram contra a Síria.

“À medida que as reformas avançam, precisamos de garantir que as sanções sejam tratadas de uma forma que permita que a Síria cuide de todas essas reformas e requisitos”, observou.

Sobre as sanções, o enviado especial da ONU para a Síria disse hoje que a criação de um Governo inclusivo no país nas próximas semanas ajudará a determinar se as sanções ocidentais serão suspensas enquanto o país se reconstrói após a deposição de Bashar al-Assad.

“O que espero é que, com um Governo verdadeiramente novo e inclusivo em vigor no dia 01 de março, isso nos ajude a suspender as sanções” impostas à Síria pelos países ocidentais durante o Governo de Assad, disse Geir Pedersen à agência Associated Press (AP) numa entrevista durante uma visita a Damasco.

O conflito sírio resultou em cerca de 618.000 mortes e 113.000 desaparecimentos, deixando inúmeras famílias para suportar o fardo da perda e da incerteza, frisou hoje a ONU no seu relatório.

Muitos dos que desapareceram foram retirados à força das suas casas, presos arbitrariamente, nunca levados à justiça e, muitas vezes, mantidos em condições desumanas, com o seu destino desconhecido.

“Esse sofrimento não resolvido pesará sobre a Síria por gerações, representando uma barreira significativa à reconciliação nacional e à recuperação sustentável”, diz o texto.

Uma coligação rebelde liderada pelo grupo radical islâmico Hayat Tahrir al-Sham (HTS) tomou o poder em Damasco após o derrube de Assad, um aliado da Rússia e do Irão.

MYMM // SCA

By Impala News / Lusa

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