Mais de 230 mil civis mortos na Síria desde 2011
De acordo com o SNHR, a grande maioria dos civis mortos na Síria ocorreu às mãos das forças do regime sírio e das milícias iranianas (201.260 pessoas ou 87% do total).
O regime da família al-Assad caiu após 54 anos de poder na Síria. Numa ofensiva de duas semanas, rebeldes sírios varreram o país, capturaram Damasco e, em 8 de dezembro, o presidente Bashar al-Assad fugiu para Moscovo. Mohammed al-Bashir, que lidera um dos grupos armados de oposição (Hayat Tahrir al-Sham), assumiu o cargo de primeiro-ministro de forma interina até 1 de março de 2025.
Passaram-se 13 anos desde que uma revolta popular na Síria foi recebida com forte repressão do regime, levando a uma guerra civil que deslocou internamente 7,2 milhões de pessoas e forçou mais 6,4 milhões de sírios a fugir para o estrangeiro como refugiados. Muitos não conseguiram escapar, com os dados da Rede Síria pelos Direitos Humanos (SNHR) a relatarem que mais de 230 mil civis foram mortos entre março de 2011 e março de 2024, com 30.193 crianças e 16.451 mulheres incluídas no número de mortes.
De acordo com o SNHR, a grande maioria dos mortos foi às mãos das forças do regime sírio e das milícias iranianas (201.260 pessoas ou 87% do total). De acordo com o relatório, mais 6.969 civis foram mortos pelas forças russas (3%), 5.056 pelo ISIS (2,2%), 4.227 por fações armadas da oposição –Exército Nacional da Síria (1,8%), 3.055 pelas forças da Coligação Internacional liderada pelos EUA (1,3%), 1.491 pelas Forças Democráticas Sírias (0,7%), 538 pelo Hay’at Tahrir al-Sham (0,2%), 4 pelo Partido Islâmico do Turquestão e 8.678 civis mortos por outros partidos (3,8%).
Como pode observar-se no gráfico abaixo, as mortes de civis atingiram o pico de março de 2012 a março de 2013, quando pelo menos 66.046 pessoas foram mortas, seguido pelo ano seguinte (março de 2013 a março de 2014), quando 61.063 mortes foram registadas. Aproximadamente 56% de todas as mortes de civis documentadas entre março de 2011 e março de 2024 ocorreram neste período de dois anos. Cada província síria viu mortes de civis nos últimos 13 anos.
O relatório regista também que cerca de 15.334 desses civis foram mortos neste período devido à tortura e detalha como 222 ataques com armas químicas foram realizados, 217 dos quais, segundo o relatório, cometidos pelo regime sírio.
Statista
Na síria, uns juntam-se à revolução e outros fogem dela
Desde a partida do ditador sírio, no passado fim de semana para a Rússia, após uma operação relâmpago das forças de oposição que culminou com a conquista de Damasco, milhares de sírios que se encontravam no vizinho Líbano começaram a cruzar fronteira de Masnaa, tornada num ponto de celebração, à semelhança da maioria das cidades do seu país.
Para a maioria, muitos dos quais sunitas perseguidos pela mão de ferro do regime de Damasco, trata-se do regresso às suas comunidades devastadas por 13 anos de guerra civil, e, de algum modo, um passo que não traz mais insegurança do que aquela que cerca de 1,5 milhões de refugiados sírios experimentam no Líbano, um país sacudido pelo conflito que há mais de um ano opõe Israel e o movimento xiita Hezbollah.
No entanto, após um primeiro êxodo logo a seguir à queda confirmada no passado domingo de mais de 50 anos da dinastia Assad, que levou o júbilo e o caos a Masnaa, o movimento começou a abrandar, enquanto, no sentido contrário, centenas de sírios indocumentados se foram acumulando em terra de ninguém entre os dois países, aguardando autorização para entrar. “Estão ali há três dias”, conta Samir, motorista libanês residente na localidade vizinha de Anjar.
Samir, que tem sido testemunha destes movimentos contrários, faz uma divisão fácil dos dois grupo. De um lado estão aqueles que “perderam o medo de viver na Síria” e do outro os que “ganharam medo” com a rápida deposição do regime, ainda que o líder da principal fação rebelde, Abu Mohammad al-Jolani, tenha usado um discurso reconciliador de uma nova realidade em que ninguém é perseguido.
“Enquanto não houver paz na Síria prefiro o Líbano”
Para ele, que não é sírio, a escolha seria menos complexa, já que “um homem [Assad] que mata mulheres e crianças nunca é de se confiar”, mas o seu país também vive momentos de alta instabilidade, apesar do cessar-fogo que interrompeu em 27 de novembro as hostilidades entre as forças israelitas e o grupo armado apoiado pelo Irão e que tem sido sucessivamente violado. “Ali ficava um aquartelamento do Hezbollah”, indica Samir, apontando para uma construção abandonada junto do lado sírio da fronteira.
Afinal, passaram apenas dois meses desde que um raide aéreo israelita atingiu a estrada a meio caminho entre os dois postos fronteiriços, deixando a via intransitável, o que obrigava todos os viajantes a fazer o percurso de uns dois pares de quilómetros a pé e as malas de uma vida às costas.
As enormes crateras abertas pelas bombas israelitas foram entretanto reparadas e a entrada na Síria, no controlo de Jdaidit Yabws, é agora assinalada por um retrato vandalizado de Bashar al-Assad, e vigiada por grupo resplandecente de militares rebeldes vestidos à civil, que, segundo Samir, vivem em cidades vizinhas e foram armados pelo comando das forças de oposição a partir de Damasco. Não pedem passaportes e oferecem sorrisos e boas-vindas a um “país livre”. Todos os edifícios de imigração e alfândega não mostram atividade e as instalações de ‘duty free’ foram pilhadas.
No lado contrário, as famílias de Yasser Ali, 40 anos e do seu irmão estão acomodadas em dois carros cheios. Partiram há duas semanas de Alepo, em simultâneo com a tomada da segunda maior cidade síria, no norte da Síria, pelas forças rebeldes do grupo Hayat Tahrir al-Sham (HTS), de al-Jolani, e têm como destino o Líbano.
“Enquanto não houver paz na Síria prefiro o Líbano”, justifica o engenheiro sírio, que diz ter abandonado Alepo apenas com a roupa que traz no corpo e colocado todos os pertences das duas famílias de 10 pessoas, incluindo seis crianças, em duas malas no tejadilho das viaturas.
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