Como está o homem que recebeu o primeiro coração de porco?
David Bennett sobreviveu a um transplante de coração de porco. “Se isto funcionar, haverá um fornecimento infinito destes órgãos para pacientes em sofrimento”.
David Bennett pediu à equipa médica para ver o jogo da Super Bowl no passado domingo, 13 de fevereiro. O homem de 57 anos, que recebeu um coração de porco em janeiro deste ano, consegue falar, respirar sozinho e até cantou um verso de “America the beautiful”, uma canção patriótica interpretada antes do início da competição. O Centro Médico da Universidade de Maryland, nos Estados Unidos, confirmou ao Jornal de Notícias que Bennett “continua bem”. “Não registamos sinais de rejeição do órgão neste momento. Está a respirar sozinho e foi-lhe retirada a ECMO [dispositivo de circulação extracorporal] a 11 de janeiro. O coração está a funcionar em pleno. Ele está acordado e a falar”, acrescentaram.
O cirurgião cardiotorácico Manuel Antunes diz que o norte-americano pode ser “o mais longo sobrevivente após um transplante animal”. Em 1984, uma bebé americana morreu um mês depois de receber um coração de babuíno. “É um bom sinal, significa que a investigação está a ir pelo lado positivo. Não sei se pelo caminho mais correto”. O também professor catedrático da Universidade de Coimbra voltou a suscitar dúvidas, tal como tinha feito em janeiro, quanto à mistura genética de animais e humanos. De recordar que o coração de porco que Bennett recebeu teve a alteração de dez genes. “Levantam-se questões éticas que é preciso resolver, ainda que seja para salvar um humano”, referiu.
Regresso a casa não está nos planos mais próximos
Num vídeo divulgado pelo Centro Médico da Universidade de Maryland, a 14 de fevereiro, é possível ver Bennett sentado na cama, amparado pela fisioterapeuta Chris Wells. A funcionária incentiva-o a cantar a música que antecedeu o jogo de futebol americano: “Cante alto e em bom som. Você consegue”, disse-lhe. Por meros segundos ouve-se a voz do norte-americano, ainda combalido. Bennett já mostrou vontade de voltar a casa e de ter a visita do cão Lucky no hospital, do qual se lembra com clareza. “Toda a gente quer que ele saia do hospital já, mas isso não vai acontecer. É um processo lento”, afirmou Muhammad Mohiuddin, diretor do programa de xenotransplante cardíaco da Faculdade de Medicina da Universidade de Maryland.
José Fragata, diretor do Serviço de Cirurgia Cardiotorácica do Hospital de Santa Marta, acredita que “rejeição do órgão há sempre, mas conseguiu ser manejada sem grandes consequências negativas para o doente”, refere. Na altura em que se soube da cirurgia, o centro médico adiantou que Bennett estava a tomar um medicamento experimental para impedir a rejeição do coração do porco. Para o clínico, “abriu-se uma caixa de Pandora” que poderá ajudar a resolver a falta de dadores para realizar transplantes cardíacos em todo o Mundo. No entanto, será preciso esperar mais tempo para cantar vitória. Se “o coração durar até ao final de um ano” é porque, “em princípio, se criou um grau de tolerância entre o hospedeiro e o órgão doado”, concluiu.
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