Doença auto-imune faz mulher vomitar 30 vezes por dia

Uma mulher sofreu durante meses com dezenas de vómitos espontâneos diariamente. A razão deixou os cientistas estupefactos.

Doença auto-imune faz mulher vomitar 30 vezes por dia

Uma jovem mulher sofreu inúmeros ataques de vómitos espontâneos, por vezes mais de 30 por dia. Acontece que os sintomas têm origem num distúrbio auto-imune. De acordo com o relatório do caso, publicado na revista Frontiers in Endocrinology, a mulher de 27 anos, também tem diabetes tipo 1, uma doença auto-imune em que o sistema imunitário ataca células do pâncreas que produzem insulina. A insulina é responsável por controlar a glicose (açúcar) no sangue. No entanto, a doença reduz o fornecimento da hormona pelo organismo, o que faz com que os níveis de açúcar no sangue aumentem.

Uma 1 em cada cinco pessoas com diabetes tipo 1 sofrem com uma doença auto-imune adicional de algum tipo, de acordo com um relatório de 2020 da revista Diabetes Care. Neste caso, tal desordem auto-imune parece impulsionar os vómitos, embora os médicos ainda estejam a tentar perceber o porquê. A paciente foi examinada pela primeira vez em 2016, quando começou a ter episódios de vómitos uma vez por mês. Depois, começou a sofrer com náuseas, dores abdominais excruciantes e vómitos. “Os episódios eram tão severos que a doente tinha episódios de vómito mais de 30 vezes por dia e o volume de vómito podia atingir os seis litros”.

Síndrome do vómito cíclico

Com base no padrão dos episódios da doente, foi-lhe diagnosticado “síndrome do vómito cíclico” (SVC), doença caracterizada por ataques de vómito súbitos intercalados com longos períodos sem sintomas. A causa exacta ainda é desconhecida, mas os investigadores acreditam que pode ter origem em sinais nervosos errados enviados entre o cérebro e o aparelho digestivo, respostas hormonais disfuncionais ao stress ou certas mutações genéticas, de acordo com o National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases.

Após dar entrada no hospital, os sintomas diminuíram. Ainda assim, e apesar de o tratamento com insulina ter sido rigorosamente monitorizado, o nível de açúcar no sangue desceu e manteve-se baixo durante vários dias. Para desfazer este caso complexo, a equipa médica realizou um exame de corpo inteiro. Porém, em declarações ao site Live Science, uma das autoras da investigação e médica do departamento de endocrinologia da Universidade de Hong Kong-Shenzhen Hospital, Dr. Wei Liang, avançou que “não foi encontrada nada de significativo”. No entanto, uma análise ao sangue da paciente revelou níveis “extremamente elevados” de moléculas imunes que inadvertidamente atacam os próprios tecidos do corpo e são encontrados em pacientes com diabetes tipo 1.

O sangue da paciente também tinha anticorpos que se ‘agarravam’ à insulina. Estranhamente, a equipa descobriu que estes pareciam fazer com que a insulina ficasse durante mais tempo no corpo do que usual para quem toma insulina. “Observámos um fenómeno invulgar de ‘reciclagem de insulina’ nesta doente”, em que a hormona estava a reentrar na corrente sanguínea em vez de ser eficientemente decomposta por células, especificou Aimin Xu, também autor do estudo e professor no Laboratório Principal de Biotecnologia Farmacêutica da Universidade de Hong Kong.

Uso de rituximab foi decisivo no tratamento

Existem várias teorias sobre o fenómeno, mas nenhuma é conclusiva. Contudo, os anticorpos explicam porque nível de açúcar no sangue da paciente estava a cair, pelo que os médicos tentaram reduzir os anticorpos com recurso a diferentes medicamentos. Descobriram que o rituximab, utilizado no tratamento de linfomas, leucemias,  e rejeições a transplantes, reduziu o número de anticorpos e corrigiu o baixo nível de glicose. “Os sintomas de vómito reduziram drasticamente nos oito meses seguintes após um fase de tratamento com rituximab”, disse Wei Liang ao mesmo site. A equipa suspeita que os auto-anticorpos no sangue da doente estavam, de alguma forma, a provocar os vómitos. Por isso, quando esses anticorpos desapareceram, também os episódios de vómito da doente cessaram.

“Na nossa opinião, a síndrome do vómito cíclico não está ligada à diabetes ou ao uso de insulina”, porque a síndrome não é mais comum em diabéticos do que no público em geral, aclarou Liang. “Como tal, pensamos que o SVC pode ser uma doença auto-imune separada”, finalizou. Para testar a hipótese, a equipa planeia continua a estudar o caso da doente e os auto-anticorpos, e eventualmente, poderão considerar a realização de ensaios clínicos com rituximab como tratamento para esta síndrome.

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